"- E que somos nós? - exclamou Ega. - Que temos nós sido desde o colégio, desde o exame de latim? Românticos: isto é, indivíduos inferiores que se governam na vida pelo sentimento, e não pela razão..."
Os Maias

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Breves considerandos irreflectidos em torno do «não-veto» presidencial


'Agora que os homossexuais se podem casar em Portugal, faz-me ainda menos sentido casar-me', comentávamos nós no outro dia pela manhã, quando os pensamentos fluem sem qualquer nexo de homenagem à racionalidade. Já o pensava antes e a perspectiva é obviamente pessoal, sou eu e os meus objectivos individuais e não pretendo nunca pensar muito para além desse horizonte, pelo menos nesta sede, aqui e agora. Mas casar não é essencial. E não é porque esteja fora de moda, nem pelo preço da 'boda', nem pelo que comem os convidados... O essencial é estarmos bem com aqueles que mais amamos e isso implica mais do que duas pessoas, isto é, bem com o companheiro, com a família e com os amigos. Se todas estas pessoas aceitarem aquilo que eu decido para mim, estará tudo bem entre mim e o mundo. Sim, claro que quero ser feliz para sempre, e até gostava de me casar vestida de branco, só que gostava que isso fosse na sala lá de casa, onde hei-de ter o meu santuário, seguindo-se um jantarinho em família. Uma coisa privada portanto.
 
Várias pessoas (Santana Lopes aqui, José Policarpo e o eleitorado católico ali) se apressaram a dizer que com a promulgação do CPMS, Cavaco Silva defraudou as expectativas dos seus eleitores, e que depois disto dificilmente será reeleito. Disparate.
Já tinha falado do CPMS neste blogue. Faço parte daqueles que entendem que o Casamento é um contrato entre homem e mulher, mas não faço disso uma bandeira. Considero que seria preferível uma solução como a encontrada no Reino Unido, o Civil Partnership, um sistema de direitos e responsabilidades em tudo semelhantes ao casamento civil, incluindo as responsabilidades parentais.
Sou a favor de todos os direitos.
Gosto da terminologia tradicional, mas não sou tradicionalista.
E por isso, ainda bem que hoje existem mais portugueses felizes em Portugal. Ainda bem se a nova lei der um passo importante para a progressiva abertura das mentalidades à diferença, e servir para travar a descriminação. Ainda bem que esta matéria não teve que ser reapreciada pelo parlamento de uma forma despropositada e desproporcionada. Ainda bem que o PR não usou o veto político. A decisão de promulgação do diploma foi, nas palavras do PR (aqui), uma decisão acima das suas convicções pessoais . Eu faria o mesmo, porque não pesa na consciência, mesmo que não se concorde. E viveremos todos felizes para sempre, enquanto povo.

2 comentários:

Terminal 23... disse...

O problema é que esta lei é em si mesma discriminatória, senão vejamos, se os homosexuais vão ter os mesmos direitos, que dizer então das uniões de facto das pessoas que por exemplo vivem com idosos para lhes prestar cuidados de saúde? Não estamos também perante uma união de facto? É que não se pode olhar para direitos e igualdades apenas para umas das partes, caso contrário, a própria lei que apregoa igualdades e direitos iguais, peca logo por ser discriminatória na sua aplicação.

Luís Lemos Santos

AGomes disse...

Olá Luís. Levantas um problema diferente. Só existe união de facto se houver comunhão de leito, mesa e habitação, ou seja, têm que dormir na mesma cama, e desde 2001 que a lei das uniões de facto confere alguns direitos, independentemente da união ser entre pessoas do mesmo sexo ou não. No caso que referes pode haver uma vivência em economia comum, também ela protegida com alguns direitos. O caminho podia ter sido feito pelo aprofundamento de direitos consagrados quer para um caso, quer para outro. No caso da União de facto, pois que se registassem uniões nas Conservatórias, mas como te digo, a solução não me choca.