"Ao contrário no campo, entre a inconsciência e a
impassibilidade da Natureza, ele tremia com o terror
da sua fragilidade e solidão. Estava ali como que perdido num mundo que
lhe não fosse fraternal; nenhum silvado encolheria os espinhos para que
ele passasse; se gemesse com fome nenhuma árvore, por mais carregada que
estivesse, lhe estenderia o seu fruto, na ponta compassiva de um ramo.
Depois, em meio da Natureza, ele assistia à súbita e humilhante
inutilização
de todas as suas faculdades superiores. De que servia, entre plantas e
bichos - ser um Génio ou um Santo? (...) Toda a intelectualidade, nos
campos, se esteriliza, e só resta bestialidade!" in A CIDADE E AS SERRAS, Eça de Queiroz.
Jacinto, da Cidade e as Serras, nascido em Paris, acreditava inicialmente que só a cidade tinha as condições para que sentisse a sua superioridade de ser pensante e se separasse, assim, 'dos bichos'.
Apesar daquela personagem mudar completamente a sua visão depois de se mudar para o campo, o que está em causa é, no fundo, a diferença entre a cidade e as serras, entre o litoral e o interior, entre a simplicidade e os salamaleques, entre a metrópole e a ruralidade, entre os múltiplos acessos de auto-estrada e as estradas nacionais e municipais que teimam em contornar montanhas, multiplicando-se em quilómetros e quilómetros que fazem resistir os seus caminheiros.
É muito mais difícil viver na montanha, envolvido em nevoeiro todas as manhãs. É inevitável, e é mais do que natural, que as montanhas, por si, e o nevoeiro ofusquem as ideias dos mais jovens e dos mais idosos. Isso acontece com as gentes tal como se escondem o horizonte e os caminhos, pela manhã, e possivelmente, por isso mesmo.
A expansão pessoal, social, profissional de cada um é sonhada de acordo com as circunstâncias, claro está, com as quais se conformam muitas vezes. Outras, porém, vincam-se anseios de mudança, que acabam por gerar o tipo de emigrante que o é em terra própria.
Muda-se.
Conhece.
Desilude-se.
Volta.
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