Afinal não tem 100 anos de perdão. Também ele comete um furto.
Mas contra quem? A questão era saber se a mera detenção de uma coisa é, em si, tutelada pelos tipos de crime contra a propriedade, nomeadamente pelo furto. Na verdade, o primeiro ladrão não tem nem a propriedade, nem qualquer tipo de fruição legítima do bem. Mas ainda que a coisa não seja dele, a detenção dele - seja a que título for - deve ser considerada para efeitos de preenchimento do crime de furto. Deve?! O regente da cadeira insistia que não. Para ele, a detenção nunca tem relevância de modo autónomo, mas só quando "em linha" com quem detém o direito de propriedade, que é o bem jurídico tutelado. Significa dizer, suponho, que o segundo ladrão está a furtar, sim, mas ao verdadeiro proprietário, sendo que só este tem direito de queixa. Exactamente, foi isso que percebi. Mas não sei se assim é. E se isto é um caso académico, posso discorrer. No caso de, eventualmente, o primeiro ladrão se arrepender - isto é, 'mudar de tenções' relativamente ao destino a dar à coisa furtada -, deveria ele próprio poder apresentar queixa. Ele era detentor, e ele foi furtado! Até porque, para todos os efeitos, foi sobre ele que naquele momento se quebrou, publicamente, a ordem de relações criada entre as pessoas e as suas coisas. Designadamente para o efeito concreto de levantamento de auto de notícia por parte de autoridade judicial, se for esse o caso.
Ora, sustentando a sua posição, dizia o regente que para a posição contrária seria forçoso admitir então que o proprietário que fosse reaver a sua coisa do ladrão poderia estar ele próprio a cometer um furto, vendo o ladrão como a vítima deste furto. E que seria como ver alheia uma coisa que, afinal, é própria. Não colhe. O meu raciocínio de imediato foi constatar que, nesse caso, nem sequer está preenchido o elemento "alheio", sendo que a coisa é do proprietário, razão que - simplesmente - explica o não preenchimento do tipo de crime.
"Quem, com legítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair coisa móvel alheia, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa."
Certamente estarei errada, mas hei-de estudar o assunto e, quem sabe, reflectir melhor sobre ele.
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